sexta-feira, 21 de outubro de 2011

ANTES DE COMEÇAR – O PROJETO

Eu sempre preciso fazer muita pesquisa antes de começar a escrever, porque preciso conhecer em detalhes o local e a época em que resolvi ambientar a história. Isso não significa que eu vá usar todos os detalhes na história, mas eu preciso conhecê-los para me sentir à vontade para criar. Eu desenhei mapas de Brugge (para O canhoto) e do Rio de Janeiro (para Construir a terra, conquistar a vida), como estou agora fazendo com São Paulo (para Rosinha), retirando partes modernas e tentando reconstruir o que havia na época das histórias.

O estudo do ambiente acontece em paralelo à construção da história, pois é necessário enquadrar a caracterização das personagens e a sucessão de eventos ao contexto escolhido. O nome de Antônio só me veio à cabeça quando eu resolvi aproveitar o contexto da imigração italiana do final do século XIX às minhas personagens. Assim, uma coisa influencia a outra, e todas juntas constroem a história do jeito que eu quero contar.

As idéias vêm de toda parte e de lugar nenhum (como já contei) e à medida que vou caracterizando as personagens, a trama prossegue, e vice-versa, até um momento de impasse, que me faz descartar a história, ou até o final do jeito que eu quero. Mesmo tendo encontrado um bom final, eu procuro outros finais possíveis, para me assegurar de escolher o melhor deles. Para isso, às vezes é necessário recuar e alterar eventos que estão mais próximos do meio do que do final. Não importa, eu gosto de testar possibilidades.

Tendo a estrutura da história e a caracterização das personagens, preciso aprofundar o estudo da ambientação, inclusive tentando descobrir fatos históricos que eu possa incorporar à minha história para acrescentar verossimilhança. Por exemplo, eu não posso deixar de citar na história que estou escrevendo agora (Rosinha) o surto de Gripe Espanhola de 1918, nem o dia mais frio da história de São Paulo, que também aconteceu em 1918. Assim, entrelaço a minha ficção na história real da cidade (e do estado) de São Paulo.

Muitas vezes, outras pesquisas, além da histórica, também são necessárias. Desta vez, quis conhecer melhor o processo de colheita e beneficiamento do café, já que os primeiros anos da história se passam numa fazenda de café. Para O canhoto, precisei estudar psicologia para entender se era possível a amnésia de Maurits, e que fatores eram necessários para que a amnésia fosse possível. Foi muito bom porque ajudou inclusive na caracterização da personagem e na estruturação dos eventos passados e futuros.

Quando tenho todas essas informações, e a certeza de que há uma boa história a ser contada, então vem a parte trabalhosa: pegar papel e caneta e começar a escrever.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

RELATÓRIO DE PROGRESSO – 4 MESES

Minha história ainda não tem título. Continuo chamando de Rosinha, embora Antonio tenha se tornado a personagem principal. Já tenho mais de 50 páginas escritas e já comecei a andar com alguns “apetrechos” na bolsa: mapas e quadro do tempo.

Eu não conheço São Paulo. Já andei por alguns pontos da cidade, mas não o bastante para dizer que sei onde ficam os bairros, os parques, as ruas, os marcos de referência. Bem, não sabia, porque imprimi alguns mapas para me auxiliarem a visualizar por onde Toni está andando. É a maravilha do Google Maps: diferentes níveis de aproximação (zoom) para que eu tenha mapas de ruas, de bairros, de região. São ao todo cinco, cada um em pelo menos duas folhas A4 coladas com fita de empacotamento. Até o final da história, conhecerei São Paulo melhor, pelo menos na área entre as Marginais (Barra Funda, Perdizes, Pinheiros, Vila Mariana) e até Tatuapé e Água Rasa. São os limites da região por onde Toni anda, procurando emprego. Até agora, ele está tendo dificuldades, mas sem maiores problemas.

Outra necessidade que senti foi de fazer um mapa temporal – um quadro de meses e anos – onde eu pudesse anotar, para consulta rápida, os principais eventos da história de São Paulo, do Brasil e do Mundo, para inclui-los na minha história. É um recurso que já usei em Construir a terra, conquistar a vida e que foi extremamente útil. Estou num momento bem interessante – os anos de 1917 e 1918 – quando a cidade de São Paulo viveu os três “G” que marcaram aquela geração: a Greve Geral de 1917; a Grande Guerra, na qual o Brasil ingressou em 1917; e a Gripe Espanhola, que chegou ao Brasil em 1918. É maravilhoso ter tantos eventos importantes para Toni participar. É uma forma simples e eficiente de dar verossimilhança à história e contextualizá-la. Então, à medida que vou lendo e pesquisando, vou preenchendo o quadro e usando as informações na história. É claro que nem todos os anos têm coisas legais para aproveitar. São momentos para aprofundar os problemas das personagens ou para dar uma “corridinha” com a narração, até outro momento interessante, seja pela história real ou pela história inventada.

Estou ansiosa para chegar logo ao próximo ponto de virada, que acontece daqui a alguns anos, quando Toni terá novamente uma escolha difícil a fazer (o nome dele foi escolhido com isso em mente, como contei aqui). São os melhores momentos, pois é quando o conflito interno da personagem explode, e conhecemos melhor seu caráter e sua personalidade. Mais um pouco e eu chego lá.

sábado, 1 de outubro de 2011

AMADURECER O AUTOR

Quando eu comecei a escrever, lá no final do século XX, não existia computador pessoal, e a Internet ainda era uma admirável forma de comunicação entre universidades e talvez alguma outra instituição ou empresa. As chances de você encontrar um colega escritor – iniciante ou experiente – eram bem escassas. Para agravar meu isolamento, eu morava em São Luís – MA e, embora se diga que “quem dorme em São Luís acorda poeta”, eu não tive o prazer de conhecer nenhum escritor nos cinco anos em que morei lá. Além do mais, eu era uma adolescente tímida, com muito pouca vida social, e não me lembro de eventos literários acontecendo na cidade.

É bem verdade que, aos 18 anos, eu estava no Rio de Janeiro, cursando Educação Artística e participando de tudo o que podia: vernissages, exposições, palestras, peças de teatro, filmes, óperas, concertos. Mas era difícil encontrar os pares literários. Autores experientes dão palestra mas, em geral, não se interessavam por ouvir uma adolescente principiante.

Mas essa historinha é para dizer que eu não tinha outros escritores a quem mostrar meus primeiros escritos, como vejo acontecer hoje, graças à Internet. Minhas amigas queridas adoravam tudo o que eu escrevia (ou não) mas não tinham experiência nem de vida nem de literatura para me indicar falhas, defeitos, incoerências, erros. Eu tive que aprender sozinha. Em 1989, quando eu fiz a primeira avaliação dos meus textos, eu percebi como eu havia melhorado, como eu estava mais experiente e amadurecida, e como muitos textos não resistem ao tempo, enquanto outros – os melhores, é claro – só precisam de ajustes para continuarem sendo considerados bons.

Quero dizer com isso que o que me fez chegar onde estou não foi a crítica alheia, mas a minha própria crítica. Então, quando hoje vejo novos escritores pedindo comentários dos outros, fico pensando se a opinião externa é assim tão importante. Isso porque os leitores podem até apontar algumas questões pertinentes, mas cabe ao escritor refletir sobre suas fraquezas e encontrar seu caminho sozinho. Amadurecer é um processo solitário, como comer, sentir, nascer, morrer. Ninguém pode fazer isso por você e, se você não estiver pronto, nenhuma opinião externa vai ajudar. Crescer é um processo lento e sofrido, e algumas pessoas não suportam a dor – por isso não conseguem crescer. Dói olhar para trás e ver que muito do que eu fiz era ruim. Dói descartar vidas que eu vivi, filhos queridos que tão boa companhia me deram. Mas, se a trama é inconsistente, se a caracterização das personagens é falha, se o texto não foi bem trabalhado – e agora sou capaz de perceber tudo isso! – então não adiante mantê-las com vida. Aos poucos, a gente aprende também a superar as perdas; a levantar após cada queda e seguir adiante; a amar os mortos porque um dia estiveram vivos, em vez de lamentar por não estarem mais vivos.

Essa é a minha trajetória. Aprendi apanhando de mim mesma; lendo e relendo meus textos e criticando-os mais severamente do que qualquer leitor faria; escrevendo e re-escrevendo, quase doentiamente, até que meu público-alvo (eu mesma) ficasse satisfeito com o resultado.

Sorte de quem está começando agora ter a Internet tão cheia de grupos e oportunidades, e poder encontrar pessoas com quem trocar idéias e leitores que indicam pontos inconsistentes a serem melhorados. Com essa ajuda, esses jovens poderão re-escrever mais, e assim alcançar mais cedo um bom nível de maturidade. É claro que precisam ser humildes para aceitar a opinião de outra pessoa, precisam refletir sobre as questões apontadas e buscar as melhores soluções. Mas não basta mudar uma passagem porque alguém falou. Não. É preciso compreender porque foi feito daquela forma, como corrigir (se for o caso) ou como justificar que tenha sido feito daquele jeito; e como evitar o erro (ou aprender a justificá-lo) no futuro. Não tem jeito: amadurecer é um processo individual e solitário.


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Um pouco sobre mim

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Mestre em História e Crítica da Arte pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Dedica-se à literatura desde 1985, escrevendo principalmente romances. É Membro Correspondente da Academia Brasileira de Poesia - Casa Raul de Leoni desde 1998 e Membro Titular da Academia de Letras de Vassouras desde 1999. Publicou oito romances, além de contos e poesias em antologias. Desde junho de 2009 publica em seu blog textos sobre seu processo de criação e escrita, e curiosidades sobre suas histórias. Em 2015, uniu-se a mais 10 escritores e juntos formaram o canal Apologia das Letras, no Youtube, para falar de assuntos relacionados à literatura.

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