quinta-feira, 21 de outubro de 2010

DESCARTEI

Resolvi finalmente descartar o conto História do Mundo. Passou bastante tempo suspenso e eu não encontrei como solucionar seus problemas estruturais. Descartar sempre dói, é uma espécie de última alternativa, quando nada mais funciona. Ao mesmo tempo que o clima é de morte, cabe a frase de Lavoisier: “nada se perde”. Os temas abordados permanecerão na minha mente e talvez venham a ser re-elaborados e retrabalhados em outra história.
Essas categorias “sobrevivente”, “suspensa”, “descartada” são muito flexíveis, e as histórias passam de uma a outra facilmente. Basta eu querer escrever para ser “sobrevivente”; basta eu desistir de escrever para ser “descartada”. Quando eu gosto mas há algo que não consigo resolver, fica “suspensa”. Se eu leio e gosto, é “sobrevivente”; se eu leio e não gosto, é “descartada”. Como estou sempre revendo meus textos e minhas listagens, as histórias têm muitas chances de movimentação até chegarem à publicação, quando se tornam de fato VIVAS.
Há uma outra história oscilando entre a vida e a morte: Um dia, depois. Considerando meu espírito crítico atual, vou continuar concordando com o contista que me convenceu a parar de escrever contos, pois um conto precisa de uma trama – não basta uma cena, mesmo que esteja bem-feita – e vou manter essa história descartada. Desta forma, me restam apenas dois contos: O cisne e Labirinto vital, já que O Além terá tratamento diferenciado, sendo publicado com ilustrações. Pelas características deles, não devem ser descartados. Mas também não posso fazer um livro com apenas dois contos curtos. Por isso resolvi juntá-los aos poemas e a outros textos curtos em prosa, que eu chamo de “peças curtas”, porque não são poemas, não são contos, não são crônicas. Todos são narrativos e contam uma história curta, ou são o pensamento de alguma personagem, ou algum tipo de depoimento pessoal ou desabafo. Difícil descrever. Em geral, são escritos em primeira pessoa (“Eu agonizava sobre o leito”, “Eu nasci sob essa árvore”, “Nascemos no mesmo dia, na mesma hora”, etc) ou é alguém falando com esse “eu” (“Vá se despir de tudo e volte para mim”), ou ainda uma descrição de cena (“Cercada pelo fogo, a vida se faz fora daqui”, “Com que coragem tu te atira na aurora!”). Há também dois diálogos, duas cenas, portanto, mas que não configuram um conto por não haver enredo, nem tempo, nem espaço, nem caracterização das personagens. Utilizei a forma de diálogo para apresentar idéias minhas. Começam assim:
1) “- Estou deprimida –ela diz ao companheiro.
- Por quê? –pergunta preocupado.
- Minha vida está no fim e eu não morri. Tanto que eu queria... Vou morrer frustrada por não ter morrido.”
2) “- Trouxe seu chá.
- Tem gosto?
- Provavelmente.
- Então não quero. Cansei desse prazer fútil. Agora descobri que o prazer que quero é o da cessação.”
São idéias meio malucas, concordo, mas eu prefiro dizer que são cenas surrealistas, alegóricas, simbólicas. Expressam o que eu penso? Não, expressam o que eu pensei quando as criei. Nem sempre eu concordo com minhas personagens. Não preciso concordar. Não preciso acreditar nos sentimentos e nas idéias que eu ponho no papel. De fato, a única coisa em que eu realmente acredito é na existência real das minhas personagens fictícias. Quando eu digo “Duarte morava aqui” ou “Nicolaas passou por essa cidade”, eu preciso de alguns segundos para lembrar de que eles nunca viveram de verdade e que é por isso que os livros de História da Civilização não registram os nomes deles nem o que eles fizeram.
Descartar uma história, qualquer que seja, é doloroso e emocionalmente complicado, mas também é bom, porque é um peso que eu tiro da minha cabeça; é uma coisa a menos com que preciso me preocupar, um problema a menos para resolver. Sei que meu inconsciente continua trabalhando nos temas e, se for necessário, eles vão reaparecer em outra história, ou os problemas serão solucionados e eu saberei como reescrever a mesma história. Não há dificuldade que meu inconsciente não saiba resolver, com sonhos e processos simbólicos, então é melhor deixar ele resolver sozinho, em vez de ficar tentando encontrar uma solução consciente e racional.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

NOVOS PROJETOS

Este ano, estou envolvida com muita coisa ao mesmo tempo, e está difícil dar conta de tudo. Além do meu trabalho com o Patrimônio Nacional, meu ganha-pão, e da minha vida pessoal, em que me desdobro em atender a todos os meus papéis sociais dentro da família, tenho que cuidar da minha carreira literária. Estou inscrita em algumas comunidades e participo delas sempre que posso. Tenho também uma lista de blogs de amigos e de pessoas que conheci pela Internet e que eu gosto de acompanhar, além das redes sociais do Orkut, Facebook e Twitter. É tanta coisa que acabo tendo que reduzir minha participação. Este mês de outubro, estou revendo todas essas minhas inserções na Internet e reduzindo ao essencial, para que eu possa ser mais ativa em menos coisas. Não adianta apenas estar inscrita, é preciso usar e tirar bom proveito.

Estou também, desde maio, cuidando da publicação do meu sétimo romance – Primeiro a honra: finalizando o texto, cuidando dos registros, contato com editora, análise de custos, etc. Vamos ver se consigo lançar mês que vem (estou dizendo isso desde junho).

E Nicolaas, que saiu da pasta em abril e eu ainda estou digitando, devagar, quando tenho tempo. Já consegui passar da página 100, mas são ao todo 376 páginas, então tenho ainda muito o que digitar. Quando eu acabar, provavelmente será hora de começar a digitar À procura e O Além.

Tenho dois livros em ponto de fazer as pesquisas prévias e começar a escrever. Um é a história de Didier (ainda sem título), que vou fazer a quatro mãos com uma amiga. Estou esperando ela me passar as informações sobre as personagens e a estrutura da trama para estudar o contexto histórico e começar a escrever. Outro é Rosinha (também sem título), que já foi citada aqui. Falta-me pesquisar o contexto histórico para situar minha história dentro dele. Mas eu sei que, se eu começar a escrever, todo o resto se tornará secundário, então é algo que não posso fazer agora. A prioridade é a publicação, para que a fila ande – terminei de escrever Construir a terra, conquistar a vida em 2002, e ainda não chegou a vez dela. Então, dada a escassez de tempo, tenho que adiar a minha escrita. Enquanto isso, vou repetindo as cenas-chave à exaustão, testando possibilidades diferentes, marcando gestos e falas que devem ser mantidos.

É engraçado pensar que não tenho tempo para o que deveria ser minha atividade principal. Mas, dada a importância da literatura no país, e minhas circunstâncias financeiras pessoais, não tenho condições de terceirizar os serviços, então tenho que eu mesma revisar meus textos, diagramar, registrar, imprimir, divulgar, distribuir – coisas que, se eu fosse famosa, teria uma editora inteira para fazer para mim. Um parêntesis: perceberam que não inclui a digitação entre esses serviços que podem ser terceirizados? É que essa tarefa eu faço questão de fazer, como espaço para uma reescrita possível.

Então, enquanto eu não esquematizar (e cumprir) minhas participações na Internet, enquanto a publicação de Primeiro a honra não sair e eu não acabar de digitar Nicolaas, não posso nem pensar em voltar a escrever. Bem, pelo menos a parte da criação eu estou exercitando...

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

NOMES (E SOBRENOMES) DAS PERSONAGENS

A escolha do nome – e sobrenome, quando necessário – das personagens principais é uma etapa importante do trabalho e às vezes me toma bastante tempo de pesquisa e reflexão até a decisão final. A grande maioria dos nomes não foi escolhida arbitrariamente, só porque é um nome que acho bonito – como em geral fazemos com nossos filhos de carne e osso. Meu sentimento quanto ao nome das personagens é o critério menos importante. Muitos são nomes que eu não daria a um filho de carne e osso mas que combinam perfeitamente com a personalidade, as atitudes e o destino de determinada personagem.

A questão óbvia deve ser: o que eu levo em consideração, quais meus critérios para escolher tal nome para tal personagem? Devo dizer que variam muito, de acordo com a trama, o ambiente, os objetivos traçados. Os nomes, para mim, estão relacionados à personalidade da personagem. Por exemplo, acho que Cecília é um nome mimoso, delicado; então, se tenho uma personagem com essas características, posso dar a ela o nome de Cecília. Às vezes penso na personagem e dou a ela o primeiro nome que me vem à cabeça (se combinar com ela, é claro). Muitas personagens têm nomes baseados em personagens de outros autores e pessoas reais, numa espécie de homenagem que eu gosto de fazer. Talvez já seja possível imaginar que tenho um arquivo onde registro as motivações que tive para os nomes-homenagem das personagens.

Por escrever muito romance histórico, eu tenho ainda que me preocupar em verificar se o nome escolhido existia na época, ou se pelo menos é passível de existência, se segue o padrão dos nomes que existiam – como Rudbert, Atilde, Archibald, Rosala, Ailan, do romance Primeiro a Honra. São nomes que não necessariamente existiam, mas que contêm as partículas e seguem o padrão de sonoridade de nomes que existiam, e isso basta para que eu possa usá-los. Quando criei a história, o casal principal se chamava Philippe e Annelies mas, quando escolhi por ambiente o século V, tive que escolher nomes mais antigos, e o casal passou a se chamar Thierry e Rosala.

Quanto a sobrenomes, eu tenho o mesmo cuidado de escolher nomes tradicionais, pois têm mais chance de serem antigos. Procuro pessoas reais da época e, se precisar inventar, também procuro por partículas componentes (por exemplo, as formas de se dizer “filho de” nas diversas línguas), uso a procedência ou uma profissão, pois sei que os sobrenomes surgiram assim. Foi o que aconteceu em Amor de redenção: não encontrei referências a sobrenomes visigodos, então supus que eles não usavam – no máximo, devia ser Fulano Filho de Beltrano, então, minha personagem ficou sendo Ágila de Toledo (procedência).

Em geral, tenho dificuldade para encontrar nomes de mulher, pois a História da Civilização não registra mais do que rainhas, santas e, quando muito, mulheres e mães de reis. E, numa história com muitas personagens, como Construir a terra, conquistar a vida, eu precisava de muitos nomes. Nem o livro “Conquistadores e povoadores do Rio de Janeiro”, de Elysio de Oliveira Belchior, que comprei para a pesquisa, me ajudou nesse ponto. Então acabei usando todos os nomes que encontrei, chegando a repetir alguns (Isabel, Teresa), e usei também outros, de que não encontrei referência, mas que são possíveis de existir, pois eram usados em outros países em séculos mais antigos (Beatriz, Juliana, Clara).

Em O maior de todos, além desse problema dos nomes das mulheres, ainda tive a questão dos sobrenomes. A origem dessa história foi um sonho que tive (a cena da queda, no meio da trama) que incluía o Conde Curt Graf. Ora, o nome da personagem me exigia situar a história na Alemanha (no caso, por causa da época, em algum reino germânico). Minha dificuldade é que não sei alemão, nem tenho familiaridade com a sonoridade e a estrutura da língua. A questão que se apresentou foi: onde vou arranjar nome e sobrenome para todo mundo? A saída que encontrei foi trazer o reino de Durpoin para a região onde hoje fica a Alsácia, e aproveitar que tenho um pouco de familiaridade com o francês para inventar sobrenomes em francês. Dessa forma, as personagens se tornaram franco-germânicas, com o prenome em alemão (Curt, Karl) e o sobrenome em um francês germanizado (Legrant, Durpoin). Recorri aos compositores eruditos alemães para a escolha dos prenomes, e ajudou-me bastante Johann Sebastian Bach, com seus muitos filhos, alguns com mais de um prenome (Karl Phillip Emannuel, Johann Christian, Wilhelm Friedmann), suas filhas (Catharina Dorothea, Elisabeth Juliana) e sua mulher Anna Magdalena. Além de Bach, aproveitei os nomes de Beethoven e da família Schumann. Por causa da carência, não me preocupei em averiguar se os nomes existiam no século XIV. Usei também nomes bíblicos, que sempre são uma boa alternativa quando se precisa de prova de antiguidade (Joseph, Jacob, Peter).

Quando fui re-escrever O canhoto, precisei mudar o nome do protagonista, de Jean Michel Beauvans para Jan Nicolaas van de Linde. Já contei aqui como foi esse processo, e como o nome original ficou de herança para Juan Miguel Torres. Da composição dele também já tratei, neste outro texto. E, quando eu pensava que tinha resolvido todos os problemas, Miguel decidiu contar a Nicolaas um certo episódio da Cruzada, de que seu fiel cavalo tomava parte. Para o Espadachim Espanhol (ou leonês, para ser mais exata), seu cavalo de guerra não é apenas um cavalo, mas um companheiro leal, quase uma pessoa. Ora, um amigo desse porte não poderia ser chamado simplesmente de “meu cavalo”, mas tem que ter, não apenas um nome, mas um nome de guerreiro valente. Passei semanas procurando uma palavra ou uma expressão que fosse digna de um cavalo tão importante, e que soasse harmoniosa em espanhol. Fiquei satisfeita com o nome que encontrei e Miguel pôde contar sua história a Nicolaas com todos os detalhes. Quando Miguel e Nicolaas moravam na Itália, Lorenzo cuidava dos cavalos e os chamava simplesmente de Uno (o cavalo de Miguel) e Due (o cavalo de Nicolaas que, para minha sorte, não precisou de um nome, pois teria que ser em flamengo).

Estou agora trabalhando numa história ainda sem nome que chamo de Rosinha [editado: a história já foi escrita e se chama De mãos dadas]. O nome da personagem feminina está portanto definido, pois foi o nome que me veio no sonho e, em geral, eu não discuto com meus sonhos, apenas acrescento, melhoro, incremento, mas procuro aproveitar da forma mais pura possível o material que me foi dado pelo Inconsciente. Então, se no sonho, o nome da moça era Rosinha, esse será o nome da personagem. Mas o nome do par dela não me foi dado, e estou tendo dificuldade para decidir. Quero um nome curto e forte, pois ele terá decisões difíceis a tomar. Já tentei Marcos, André, Paulo, mas na hora dos diálogos, o nome me foge da memória, o que significa que ainda não cheguei à melhor possibilidade. Às vezes eu o chamo de Pedro, mas é um nome que eu procuro evitar, pois é o nome comum dos exercícios de criação (aquelas histórias que eu faço sem compromisso), baseado nas minhas bonecas de papel. Mas, se eu não encontrar outro nome que funcione, terá que ficar mesmo esse. Estou quase escrevendo essa história. Só me falta mesmo tempo de fazer a pesquisa de ambientação (São Paulo, década de 1920).

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Um pouco sobre mim

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Mestre em História e Crítica da Arte pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Dedica-se à literatura desde 1985, escrevendo principalmente romances. É Membro Correspondente da Academia Brasileira de Poesia - Casa Raul de Leoni desde 1998 e Membro Titular da Academia de Letras de Vassouras desde 1999. Publicou oito romances, além de contos e poesias em antologias. Desde junho de 2009 publica em seu blog textos sobre seu processo de criação e escrita, e curiosidades sobre suas histórias. Em 2015, uniu-se a mais 10 escritores e juntos formaram o canal Apologia das Letras, no Youtube, para falar de assuntos relacionados à literatura.

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