Quero
falar sobre a dupla função / dupla caracterização da personagem de Letícia Prado. Há alguns dias atrás, vi uma dica no Facebook de Ricardo Ragazzo (espero que o link funcione) que
rendeu comentários, incluindo a questão “resumirás teu livro em apenas uma palavra”. Nem
uma sinopse (cerca de 20 linhas), nem uma frase (máximo de três linhas), mas
apenas uma palavra. Certamente, a questão é “defina qual é o tema absolutamente
principal da história”, para não se afastar dele, nem deixá-lo ficar secundário.
É claro que quis aplicar isso, e defini como tema principal da história de Toni
a palavra “ambição”. Afinal, foi por isso eu ele saiu da casa do pai, é por
isso que ele está sofrendo todo tipo de necessidade e tentação em São Paulo.
Então,
diante da definição dessa palavra-tema principal, Letícia Prado é uma aliada,
pois ela entra na história para ajudar Toni a resolver essa questão com o
dinheiro. Mas, embora Toni seja movido, sim, por uma grande ambição, ele não quer
o dinheiro (e uma vida melhor) apenas para ter, para si mesmo. Ele quer
dinheiro para se casar com Rosa. Ele quer uma vida melhor para dividir com
Rosa. Então, embora o tema da história e a motivação da personagem principal sejam
a ambição, o objetivo da personagem é o amor. Por esse ponto de vista, Letícia é
antagonista de Toni, pois a solução que ela oferece a ele o afasta de Rosa. Então
fiquei pensando como é interessante construir essa personagem que é ao mesmo
tempo uma aliada e uma inimiga, pretensa-mocinha e quase-vilã, além de ter uma
personalidade frágil porém firme e decidida.
Quando
inventei o artifício “Letícia” na tentativa de resolver e dar emoção à estadia
de Toni em São Paulo (já que ela é aliada e inimiga), percebi que tinha
finalmente uma história possível (não é a primeira vez que tento escrever essa
história), que eu não estava conseguindo construir sem ele.
Mas a presença de Letícia quase me fez descartar mais esta versão da história
porque, nessa segunda fase da história, é ela quem posa de mocinha, tentando
roubar o lugar de Rosa na vida de Toni e na estrutura da história. Só quando
consolidei a posição de Rosa é que eu pude permitir a existência de Letícia.
Então mais uma vez ela é dúbia, sendo ao mesmo tempo o possibilitante e o
inviabilizante da história.
Estou
escrevendo a parte em que Letícia Prado começa a brilhar na história. Espero
que os leitores se deixem levar por sua personalidade forte numa aparência frágil,
e se afeiçoem a ela, sem perceber como ela se esforça por afastar Toni de seu
objetivo, que é casar-se com Rosa. Espero também que os leitores perdoem seu egoísmo
e entendam seus motivos; e por fim, lamentem quando ela sair da história, no
final da segunda fase (lembrando que sair da história não significa morrer,
apenas afastar-se da trama principal). Letícia Prado: uma personagem para ser
amada na segunda fase e superada na terceira fase. Adoro isso!