sexta-feira, 1 de abril de 2011

CLASSIFICAÇÃO LITERÁRIA

Muitas de minhas histórias são ambientadas no passado e, por isso, eu as considerava romance histórico, mas ainda não tinha encontrado uma definição que justificasse minha classificação. Ao contrário, encontrava definições que diziam que romance histórico é ficcionar a vida de pessoas que existiram de verdade – que é algo que eu absolutamente não faço. Então, um dia, encontrei, não sei mais como, a definição de Györg Lukács, que abarca os meus romances. Como ele é um filósofo e lingüista reconhecido internacionalmente, com diversos livros publicados e estudados, acho que posso confiar no que ele diz, e considerar acertadamente que o que eu escrevo são romances históricos pois, segundo Lukács, o romance histórico “exige não só a colocação da diegese em épocas históricas remotas, como uma estratégia narrativa capaz de reconstituir com minúcia os componentes sociais, axiológicos, jurídicos e culturais que caracterizam essas épocas”. Além disso, deve apresentar as seguintes características: “1) traça grandes painéis históricos, abarcando determinada época e um conjunto de acontecimentos; 2) a exemplo dos procedimentos típicos da escrita da História, organiza-se em observância a uma temporalidade cronológica dos acontecimentos narrados; 3) vale-se de personagens fictícias, puramente inventadas, na análise que empreendem dos acontecimentos históricos; 4) as personalidades históricas, quando presentes, são apenas citadas ou integram o pano de fundo das narrativas; 5) os dados e detalhes históricos são utilizados com o intuito de conferir veracidade à narrativa, aspecto que torna a História incontestável; 6) o narrador se faz presente, em geral, na terceira pessoa do discurso, numa simulação de distanciamento e imparcialidade, procedimento herdado igualmente do discurso da História”. (György Lukács. O romance histórico.)

Dessa forma, seriam romance histórico Pelo poder ou pela honra, O maior de todos, Primeiro a honra, A noiva trocada, Construir a terra, conquistar a vida, Fábrica, O canhoto, Rosinha (que eu ainda nem escrevi, mas que vai falar da imigração italiana, das fazendas de café, da industrialização de São Paulo no início do século XX, além da Semana de Arte Moderna que eu, como historiadora da arte, não poderia deixar de visitar). Em Construir a terra, conquistar a vida e O canhoto, não apenas detalhei o ambiente histórico mas fiz minhas personagens participarem ativamente dos eventos históricos reais, e contracenarem com pessoas que existiram de verdade e isso dá às histórias uma consistência maior do que simplesmente uma boa contextualização. Em O destino pelo vão de uma janela e Vingança, que também são ambientadas no passado, a contextualização é mais superficial porque não é importante para o desenvolvimento da trama e isso faz que não possam ser consideradas romance histórico, pois lhes faltam o primeiro e o quinto itens. O processo de Ser, além do caráter absolutamente intimista, que por isso dispensou uma contextualização muito detalhada, se passa na época em que foi escrita (embora hoje já tenha se tornado passado). Considero que O Aro de Ouro é ficção científica, por acontecer numa realidade virtual e que Nem tudo que brilha... é terror, porque se baseia em Edgar Allan Poe. Amor de Redenção tem uma fase no passado, que seria romance histórico se tivesse se tornado toda a história, mas está ambientada na mesma época em que foi escrita – aliás, é uma história que se projeta para o futuro e que, portanto, ainda está em curso.

Percebo no mundo literário um certo tom pejorativo quando se fala em “romances de banca de jornal”, ou nos “romances água-com-açúcar”, conceitos que muitas vezes convergem no mesmo objeto. Às vezes o romance de amor se confunde com o romance água-com-açúcar. Talvez por isso eu considere que meus romances não têm características desses tipos de livro mas na verdade não me sinto em condições ideais para julgar. A única das minhas histórias que eu declaro ser romance água-com-açúcar” é A noiva trocada. Em todas as outras, minha impressão é de que há temas e conflitos mais importantes do que a conquista do amor – embora muitas vezes esse seja o objetivo das personagens. Fico pensando se o amor não está presente apenas como uma última chance das personagens se sentirem felizes, depois de tudo por que passaram durante a história, e de todas as perdas que sofreram ao longo do percurso. Na verdade, não me preocupa que meus romances – inclusive os históricos – sejam considerados “água-com-açúcar”, mesmo que em tom pejorativo. O que me importa é que eu conto a história que eu quero, do jeito que eu quero. Não produzo para os críticos, mas para mim mesma.

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Mestre em História e Crítica da Arte pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Dedica-se à literatura desde 1985, escrevendo principalmente romances. É Membro Correspondente da Academia Brasileira de Poesia - Casa Raul de Leoni desde 1998 e Membro Titular da Academia de Letras de Vassouras desde 1999. Publicou oito romances, além de contos e poesias em antologias. Desde junho de 2009 publica em seu blog textos sobre seu processo de criação e escrita, e curiosidades sobre suas histórias. Em 2015, uniu-se a mais 10 escritores e juntos formaram o canal Apologia das Letras, no Youtube, para falar de assuntos relacionados à literatura.

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