Interessante analisar comparativamente a estrutura das
histórias, procurando se há um padrão – se eu sigo uma fórmula pessoal. É
verdade que não costume me prender a dogmas, dicas, fórmulas, quando estou
inventando, mas isso não quer dizer que não os esteja usando, mesmo que
inconscientemente. Tive um professor na faculdade de Educação Artística que
costumava dizer algo como “inconscientemente não é ignorantemente”, para dizer
que, mesmo que o artista não faça escolhas conscientes, mesmo que não saiba
explicar suas escolhas, ele sabe muito bem que está escolhendo o que é mais
apropriado para sua obra. Então resolvi fazer mais uma tabela, para verificar
quantas fases distintas cada história tem, e onde está o clímax de cada uma
delas. Descobri que posso dividir a grande maioria em três fases (7 histórias)
e que, nessas, o clímax está na terceira fase. Em outras 5 histórias, há duas
fases, com o clímax na segunda fase e apenas duas histórias não consegui
dividir em fases, pois a ação segue num continuum sem interrupção.
Não estou chamando de “fases” as divisões estruturais
necessárias a um romance: apresentação, desenvolvimento, clímax, conclusão.
Estou dividindo apenas o desenvolvimento. A apresentação necessariamente faz
parte da primeira fase e o clímax com a conclusão estão na última, seja ela a
segunda ou a terceira, ou a mesma primeira com que a história começou. O que
marca essa divisão em fases são pontos de virada determinantes, que fazem a
história dar uma guinada e mudar de rumo. Não são pontos de virada de
comprometimento da personagem principal com seu objetivo, mas justamente quando
a personagem muda de planos.
Vamos exemplificar:
Fase 1 – fazenda, apresentação das personagens,
apresentação dos objetivos, Toni vai para São Paulo, trabalha e ganha dinheiro,
dificuldades (Fase “Toni”).
Fase 2 – Letícia chega com dinheiro e uma proposta,
Letícia influencia a vida de Toni, Letícia se afasta de Toni (Fase “Letícia”).
Fase 3 – Toni tenta se manter e organizar a vida, Toni
volta à fazenda. As coisas não acontecem como ele esperava, e ele precisa
redescobrir sua própria identidade e objetivos. Clímax e conclusão. (Fase “Rosa”).
2)
O canhoto:
Fase 1 –
apresentação das personagens, apresentação do problema, Ten Duinen,
Maurits, casa do pai (Fase “Bruges”).
Fase 2 – Aachen, Antwerpen, Gênova, conhece Miguel,
Cruzada (Fase “Exílio”).
Fase 3 – volta a Bruges. As coisas estão diferentes do
que ele esperava e ele precisa organizar novamente sua vida. Clímax e conclusão
(Fase “Bruges”).
Em seis histórias de três fases, a estrutura é mais ou
menos como essas que apresentei: a personagem de alguma forma volta a suas
origens na terceira fase, mas tudo está diferente: o ambiente, as pessoas, e
ela mesma, que amadureceu durante os eventos da primeira e da segunda fases. São
assim O destino pelo vão de uma janela, O maior de todos, Primeiro a honra, Não é cor-de-rosa, e as já citadas O canhoto e Rosinha. Apenas uma
história com três fases é diferente, a ponto de, num primeiro momento, eu ter
considerado que havia apenas uma fase: Construir a terra, conquistar a vida.
Mas há marcadamente três momentos na história. Um primeiro, em que Duarte e
Fernão lutam para se estabelecerem na terra nova. Na segunda fase, já de alguma
forma estabelecidos, é preciso manter o que foi conquistado, e preparar a
próxima geração para não ter que enfrentar os mesmos problemas. Depois, na
terceira fase, é hora dos filhos também decidirem seus rumos, e conquistarem
suas vidas. Na terceira fase também ficam o clímax e a conclusão.
Nas histórias com duas fases, o que acontece é um
contraponto, uma espécie de duelo entre duas personagens, dois temas, duas
questões. Na primeira fase, prevalece um deles e, no segundo, prevalece o
segundo, encaminhando para a conclusão. Um exemplo é A noiva trocada, em que
Inês prevalece na primeira fase e, troca desfeita, a segunda fase pertence a
Assunción. Também têm duas fases Pelo poder ou pela honra, O aro de ouro, Nem tudo que brilha... e Amor de redenção. Em todas essas, há
apenas um ponto de corte, de mudança de rumo na história.
E não consegui dividir em partes O processo de Ser nem Vingança.
São histórias curtas, lineares, sem contrapontos, sem pontos de virada dramáticos.
É um fluxo apenas, um encadeamento que vai somente numa direção, da apresentação
ao clímax e à conclusão.
As mais intensas são provavelmente as histórias com três
fases, inclusive porque nelas o protagonista volta ao ponto inicial modificado
por sua jornada e percebe que não existe retorno, mas somente uma caminhada
sempre em frente, sempre construindo coisas novas, mesmo que aparentemente
sobre o que já foi um dia. Assim também é a nossa vida: sempre em frente. A
repetição da rotina é apenas uma abstração da nossa mente controladora, e não
existe na realidade. Cada dia é um novo dia.
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